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22/02/2017 - A polêmica da velocidade nas marginais
EM JANEIRO, A ATUAL GESTÃO MUNICIPAL DE SÃO PAULO AUMENTOU O LIMITE MÁXIMO NAS PISTAS EXPRESSA, CENTRAL E LOCAL. TAL PLANO IMPACTA DE FORMA NEGATIVA A SAÚDE PÚBLICA, DIZEM ESPECIALISTAS EM MEDICINA DE TRÁFEGO
Em 20 de julho de 2015, a então administração pública da cidade de São Paulo adotou a redução de velocidade nas marginais dos rios Tietê e Pinheiros. Um ano após a medida, que integrava o ‘Programa de Proteção à Vida’, a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) apresentou o balanço de diminuição em número de acidentes e atropelamentos. Mas, desde a 0h do dia 25 janeiro deste ano, foram restabelecidos os antigos limites máximos, após a Justiça acatar recurso do prefeito João Doria e suspender a decisão provisória que impedia o aumento da velocidade.
Com o programa Marginal Segura, lançado recentemente pela Prefeitura, as sinalizações passaram a indicar os novos limites máximos, de 90 km/h (pista expressa), 70 km/h (central) e 60 km/h (local), contra os antigos 70 km/h, 60 km/h e 50 km/h, respectivamente, da gestão Haddad. A exceção é a faixa mais à direita da pista local, que permanece com o limite de 50 km/h.
Entidades médicas ligadas ao trânsito criticam o planoatual. De acordo com Dirceu Rodrigues Alves Júnior, diretor de Comunicação e do Departamento de Medicina de Tráfego Ocupacional da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), o prefeito não consultou especialistas da área para tomar a decisão, baseando-se em uma determinação pessoal. “É uma medida errada de um gestor que se considera um ‘achólogo’ quando se depara com a necessidade de aumentar a velocidade nas marginais. A redução do limite precisa ser respeitada”, crítica.
Nos primeiros 12 meses após a implantação da redução, a CET divulgou um balanço em que mostrou a redução de 52% no número de acidentes fatais nas marginais. “Isso sem dúvida repercute na saúde pública, de forma global e até individual”, destaca o presidente do Departamento Científico de Medicina de Tráfego da Associação Paulista de Medicina, Dirceu Diniz. Além da queda em número de óbitos e em atendimentos e internações por acidentes de trânsito, os índices refletem no aspecto econômico, segundo Diniz. “Gera menos gastos à Previdência e ao Sistema Único de Saúde.” “Temos em torno de 43 mil óbitos por ano, com 360 mil incapacitados temporariamente para o trabalho e outros definitivamente. Sabemos que a velocidade é o principal fator desencadeante dessas causas. Por isso, temos de trabalhar em cima de sua redução, mostrando à sociedade que o excesso de velocidade leva os indivíduos às portas dos prontos-socorros”, completa o diretor da Abramet.
Tendência mundial
A redução do limite de velocidade é apoiada pela Organização das Nações Unidas (ONU). As cidades de Nova York e Londres, por exemplo, seguem a tendência e diminuíram as máximas em suas avenidas, tendo como consequência a queda no número de mortes. “Sabemos também que foi feito um estudo em Londres em que se constatou que com 32 km/h, o indivíduo é capaz de produzir 5% de óbitos em pedestres. Se ele aumenta essa velocidade para 45 km/h, vai para 48% e se sobe para 64 km/h, para 85%”, explica Alves.
O estado de tensão do condutor tambémé maior quando a velocidade regular é mais alta, acrescenta o presidente do Departamento Científico de Medicina de Tráfego da APM. “Muitos motoristas informam que, com a velocidade menor, conseguem dirigir mais calmos, pois todos na via estão no mesmo ritmo. Eles ficam menos apreensivos até mesmo com os outros condutores, que antes tentavam ultrapassagens ou estariam a uma velocidade muito superior às deles”, esclarece.
O programa Marginal Segura inclui melhoria de sinalização nas vias, ações educativas e fiscalização. Ainda de acordo com a Prefeitura, vendedores ambulantes e moradores de rua serão retirados das vias. Na avaliação dos especialistas da área médica, isso não significa trânsito seguro, porque os condutores e passageiros dos veículos ainda estarão em situação de perigo. “Teremos lesões mais graves e morrerão indivíduos dentro de seus carros, porque a velocidade aumenta a energia cinética e os veículos são frágeis para absorver o impacto e impossibilitar a transmissão para seu interior”, analisa o diretor da Abramet.
Paulistanos aprovam medida
Em meio à polêmica em torno do limite máximo nas vias, pesquisa divulgada pela ONG Rede Nossa São Paulo aponta que 54% dos paulistanos são favoráveis às velocidades mais altas nas marginais. Para estudiosos, trata-se de uma cultura que pode ser transformada através de políticas educativas sobre trânsito.
Todas as medidas têm resistência no início, de acordo com Diniz. Isso ocorreu com as leis de obrigatoriedade do uso de cinto de segurança e de cadeirinhas adequadas para crianças em carros, que com o tempo tornaram-se uma prática automática que diminuiu muito o número de mortes e a gravidade dos ferimentos dos acidentados. Por isso, reforça a necessidade de um estudo mais eficiente e científico do poder público. “Nós nos preocupamos com os acidentes, porque somos direcionados a manter a vida. Melhorar a qualidade de vida no trânsito é também reduzir o número de atropelados e mde óbitos, que estão muito alto no nosso País”, conclui.
Matéria publicada na Revista da APM - ed 685 - jan/fev 2017