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25/10/2016 - Abertura de escolas médicas x qualidade de ensino
CONVIDAMOS SETE ESPECIALISTAS, ALÉM DO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, PARA DEBATER O TEMA
O Ministério da Educação (MEC) anunciou, em setembro, a abertura de 37 novas escolas médicas, distribuídas ao longo do País. Assim, serão abertas mais 2.290 vagas nessas novas faculdades de Medicina no País e mais 593 em cursos já existentes. Anteriormente, 39 cidades haviam sido classificadas via edital, mas duas foram eliminadas do processo por conta das instituições candidatadas não cumprirem alguns requisitos.
Atualmente, há 266 escolas médicas, segundo o cadastro eletrônico de Instituições e Cursos de Educação Superior do MEC – o Brasil já é o segundo na lista de países com o maior número de instituições. No mapa ao lado, é possível verificar onde as faculdades de Medicina em atividade estão e ainda relacioná-las ao número de médicos e da população em cada unidade federativa. É possível perceber, inclusive, a má distribuição dos profissionais médicos, mais concentrados no eixo Sul-Sudeste.
De acordo com a Demografia Médica 2015, o Brasil conta com 2,11 médicos a cada mil habitantes, número que vem crescendo ao longo do tempo. Em 1920, por exemplo, havia 14.031 médicos registrados, para uma população de 30 milhões, o que dava uma relação de 0,45 médico por mil habitantes.
Quarenta anos depois, em 1960, a relação havia subido pouco, para 0,49 – frente a 34.792 médicos e população de 70 milhões. Novamente 40 anos depois, em 2000, a população dobrou, para 169 milhões, e o número de médicos registrados aumentou oito vezes, atingindo a marca de 291.926 profissionais e 1,72 médico por mil habitantes.
Como já dito, a distribuição dos profissionais é irregular. Enquanto há capitais como Vitória e Porto Alegre, com 11,9 e 8,9 médicos por mil habitantes, respectivamente, Macapá (1,42) e Rio Branco (2,03) ficam na outra ponta.
Na esteira da decisão do MEC, e levando em conta a necessidade emergente de discussão sobre o tema, a Revista da APM convocou especialistas para trazerem suas contribuições. Participam desta edição Antonio Celso Nunes Nassif, ex-presidente da Associação Médica Brasileira (AMB); José Luiz Gomes do Amaral, ex-presidente da Associação Médica Mundial e diretor da Associação Paulista de Medicina; Jose Otavio Costa Auler Junior, diretor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP); Emília Inoue Sato, diretora da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM/Unifesp); José Eduardo Lutaif Dolci, diretor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa São Paulo; Luiz Henrique Mandetta, deputado federal e médico; e Bráulio Luna Filho, coordenador do Exame do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), além do Ministério da Educação.
Convidados a debater a preocupação da classe médica com a qualidade de formação dos novos profissionais, diante da abertura acelerada e indiscriminada de vagas, o Ministério da Saúde, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), a Associação Brasileira de Educação Médica (Abem) e o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) não quiseram participar.
Abaixo, você verá abordados temas como a qualificação dos preceptores, o número excessivo de escolas médicas, as mensalidades das universidades privadas, a obrigatoriedade de residência em Medicina de Família e Comunidade, as experiências do Exame do Cremesp, as propostas de exames terminais reprobatórios, os critérios de abertura de faculdades, a fiscalização das instituições e, claro, a qualidade do ensino.
Antonio Celso Nunes Nassif - Prognóstico preocupante - O ensino médico no Brasil virou um negócio para ganhar dinheiro. Estamos hoje com 271 cursos de Medicina em funcionamento, oferecendo 25.178 vagas anualmente. Ocupamos o segundo lugar na escala mundial, perdendo apenas para a Índia. continue lendo
Jose O. Costa Auler Jr - Muitas instituições de ensino não oferecem prática - Embora possa garantir a prática supervisionada, é provável que a supervisão não tenha harmonia com o curso médico, ou seja, continuamente avaliada. Essa dissociação entre docentes e instrutores pode comprometer a formação do médico, notadamente quando as habilidades e competências necessárias para o exercício seguro da Medicina não são garantidas por conta dessa ausência de cenários e instrutores qualificados. continue lendo
José Eduardo L. Dolci - Falta uma Política Nacional da Carreira Médica - A justificativa para a abertura de tantas escolas médicas no Brasil, baseada no argumento de que faltam médicos, não condiz com a realidade. continue lendo
José Luiz Gomes do Amaral - O exame terminal salvaguarda a Medicina - O sistema de saúde, por sua vez, depende de investimento e boa gestão. Investe-se muito pouco e mal em saúde pública, assim temos uma atenção à saúde limitada e ineficiente. continue lendo
Emília Inoue Sato - É preciso integrar o conhecimento à prática profissional - Não concordamos que a falta de médicos se resolve com o aumento de escolas médicas. continue lendo
Luiz H Mandetta - Abertura desenfreada e sem critérios de faculdades de Medicina - Há movimentação parlamentar para que sejam aprimoradas as leis de fiscalização, regulação e abertura de escolas médicas. continue lendo
Bráulio Luna Filho - Precisam de mecanismos externos de avaliação para evoluir - As escolas têm programas de acompanhamento. Elas são monitoradas, prestam contas ao Ministério da Educação, que avalia a estrutura docente da instituição e irá aplicar agora a Anasem.continue lendo
Ministério da Educação (MEC)
Fiscalização sistemática e critérios definidos para novas escolas
O Ministério da Educação (MEC) é um órgão de administração federal direta, que tem por área de competência a política nacional de Educação. A instituição é responsável por educação infantil, fundamental, média e superior e compete a ela a avaliação, a informação e a pesquisa educacionais e a pesquisa e a extensão universitárias, entre outras atribuições. Atualmente, a pasta é comandada por José Mendonça Bezerra Filho, administrador de empresas que foi, por duas gestões, vice-governador do estado de Pernambuco. À Revista da APM, o MEC se posicionou de forma institucional a respeito da Lei dos Mais Médicos, dos critérios para a abertura de novas escolas e da estruturação e fiscalização das instituições.
MAIS MÉDICOS
Sua implementação, pela Lei nº 12.871/13, estabeleceu como objetivos diminuir a carência de médicos em regiões prioritárias; fortalecer a prestação de serviços de atenção básica em saúde; aprimorar a formação médica, proporcionar mais experiência no campo de prática médica durante o processo de formação e ampliar a inserção do estudante de Medicina nas unidades de atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS).
Para alcançar essas finalidades, a Lei também estabeleceu a reordenação da oferta de cursos de Medicina e vagas para residência médica, priorizando regiões com menor relação de vagas e médicos por habitante e com estrutura de serviços de Saúde em condições de ofertar campo de prática suficiente e de qualidade para os alunos; estabelecimento de novos parâmetros para a formação médica no País; e promoção, nas regiões prioritárias do SUS, de aperfeiçoamento médico na área de atenção básica em saúde, mediante integração ensino-serviço, inclusive por meio de intercâmbio internacional.
A reordenação da oferta de cursos de Medicina e de vagas para residência médica, assim como o estabelecimento de novos parâmetros para a formação médica no País, exigiu a definição de novos procedimentos, regras e formas de abordar a graduação, no âmbito do Ministério da Educação.
ESTRUTURAÇÃO
Para os novos cursos de Medicina em instituições privadas de ensino superior, inaugurou-se a seleção de municípios e de propostas das faculdades por meio de editais de chamamento público de ampla concorrência. O Edital nº 03/2013, por exemplo, estabeleceu que o município, para sediar curso de Medicina, deveria atender obrigatoriamente aos seguintes critérios:
- hospital de ensino ou unidade hospitalar com este potencial, conforme legislação de regência;
- número de leitos SUS disponíveis por aluno maior ou igual a cinco, ou seja, para um curso com 50 vagas, o município deverá possuir, no mínimo, 250 leitos SUS disponíveis;
- existência de hospital com mais de 100 leitos exclusivos para o curso;
- existência de leitos de urgência e emergência ou prontosocorro;
- existência de Centro de Atenção Psicossocial – CAPS;
- número de alunos por equipe de atenção básica menor ou igual a três, considerando o mínimo de 17 equipes;
- existência de, pelo menos, três programas de residência médica nas especialidades prioritárias: Clínica Médica,
Cirurgia, Ginecologia e Obstetrícia, Pediatria e Medicina de Família e Comunidade;
- adesão, pelo município, ao Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade na Atenção Básica – PMAQ, do Ministério da Saúde.
CRITÉRIOS
No caso das instituições privadas de educação superior, o Edital nº 06/2014 previu o atendimento, resumidamente, aos seguintes critérios para a oferta do curso de Medicina: capacidade econômico-financeira, regularidade jurídica e fiscal da mantenedora, experiência regulatória da Instituição de Ensino Superior (IES) e da mantenedora (quanto à qualidade institucional e de cursos, experiência na oferta de cursos de graduação e pós-graduação em Medicina); qualidade e pertinência da proposta, contendo projeto pedagógico do curso de Medicina; plano de formação e desenvolvimento da docência.
Publicado na Revista da APM - outubro 2016 - edição 682