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29/10/2020 - Após pressão, Governo Federal revoga decreto que permitia participação privada nas UBSs
Na última quarta-feira, 28 de outubro, o presidente da República, Jair Bolsonaro, anunciou a revogação do Decreto 10.530, que estimulava estudos e parcerias entre poder público e iniciativa privada na construção, modernização e operação de Unidades Básicas de Saúde (UBS).
O texto, que havia sido assinado por ele e pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, fazia parte do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), projeto de concessões e privatizações do Executivo. Segundo Bolsonaro, o decreto pretendia apenas viabilizar o término de obras nas UBS e permitir que usuários buscassem a rede privada com despesas custeadas pela União.
O projeto foi fortemente criticado por entidades médicas, parlamentares, ministros e especialistas, todos preocupados com a possibilidade de privatização da atenção primária do Sistema Único de Saúde (SUS).
Para o diretor de Defesa Profissional da Associação Paulista de Medicina, Marun David Cury, o Decreto, no fundo, significava uma tentativa de privatização no sistema público de Saúde. “Isso seria muito ruim para o trabalho do médico, já tão precarizado, e para a população, que já convive com dificuldades para conseguir acesso ao atendimento básico”, argumenta.
Repercussão
A Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC) foi uma das organizações a se posicionarem contrariamente ao decreto. Em comunicado divulgado na última quarta-feira, 28, a instituição lamentou o fato de a publicação do Executivo ter sido realizada sem nenhuma consulta à população ou às entidades de Saúde, como o Conselho Nacional de Saúde (CNS) e as Secretarias de Saúde.
Diz trecho da nota: “A abertura à iniciativa privada mercantiliza necessidades de Saúde, aproveitando-se da capilaridade da APS e da vulnerabilidade da população, possivelmente incentivando despesas por determinados procedimentos dispensáveis e iatrogênicos que tanto podem interessar a grupos privados quanto restringir, em sistemas de gerenciamento com fins econômicos, práticas assistenciais necessárias”.
A Sociedade reconhece que o SUS demanda, como qualquer sistema de saúde do mundo, aprimoramento contínuo de seus instrumentos de gestão e implementação, mas exatamente pela complexidade da construção das políticas de Saúde isso precisa ser feito a partir de pactuações democráticas, envolvendo as entidades do Controle Social, através do Conselho Nacional de Saúde, bem como os demais entes federativos, gestores do SUS, entidades científicas e sociedade em geral.
“Temos ressalvas à participação da iniciativa privada na atenção primária especialmente por conta da questão de equidade do Sistema Único de Saúde (SUS). É a atenção primária que chega aos mais vulneráveis e mais pobres. Não entendo o interesse da iniciativa privada, que atua em áreas com possibilidade de lucro”, completa Julia Morelli, diretora de Comunicação da SBMFC.
A médica de família também argumenta que essa iniciativa acontece após uma sequência de outras atitudes que facilitam a privatização do sistema de Saúde e enfraquecem a atenção básica. “Teve a Política Nacional de Atenção Básica, de 2017, que desconfigurou as Equipes de Saúde da Família, e o novo financiamento da atenção primária, que inseriu metas quantitativas no setor”, relembra.
Em vídeo, o presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), Fernando Pigatto, também se manifestou contra “a arbitrariedade do decreto”, que em seu entendimento tinha “intenção de privatizar as UBS em todo o Brasil”. “Neste momento, precisamos fortalecer o SUS contra qualquer tipo de privatização e retirada de direitos”, disse.
No Congresso Nacional, apenas no dia 28 de outubro, já haviam sido apresentados três Projetos de Decreto Legislativo que buscavam a suspensão do Decreto 10.530 do Executivo.