ÚLTIMAS

21/06/2017 - Carlos Alberto Vieira de Gouveia - O início do fim

CARLOS ALBERTO VIEIRA DE GOUVEIA, presidente da Comissão de Direito Previdenciário da OAB-SP

SOB A PÁLIDA ALEGAÇÃO DE UM PSEUDODÉFICIT, O GOVERNO TRAZ À POPULAÇÃO MEIAS VERDADES PARA DAR CONTEXTO AO SEU IDEÁRIO REFORMISTA

A Medida Provisória 726/16 trouxe à baila a nova estrutura previdenciária, da seguinte forma: extinguindo o Ministério da Previdência Social e deixando o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) subordinado ao Ministério do Desenvolvimento Social; modificando o nome do Conselho de Recurso de Previdência Social para Conselho de Recurso do Seguro Social; e do Conselho Nacional de Previdência Social e da Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social para Conselho Nacional de Previdência (com supressão do termo social – e aparentemente também do viés) e Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência.

Tudo isso se deu porque o presidente da República e alguns assessores entenderam que a Previdência registra rombo crescente: os gastos saltaram de 0,3% do PIB, em 1997, para projetados 2,7% em 2017. Sendo que em 2016, segundo o Governo, o déficit da Previdência alcançaria a marca de R$ 149,2 bilhões (2,3% do PIB) e que, em 2017, o rombo alcançaria a marca de mais de R$ 181,2 bilhões. Assim, sob a pálida alegação de um pseudodéficit, o Governo traz à população meias verdades para dar contexto ao seu ideário reformista, como “Os brasileiros estão vivendo mais, a população tende a ter mais idosos, e os jovens, que sustentam o regime, diminuirão a ponto de não mais conseguirem manter o sistema”. Por mais que algumas situações realmente estejam acontecendo, não ocorrem da forma e no contexto que o Governo narra.

Como já amplamente divulgado por todos os especialistas em direito previdenciário, que defendem que não há déficit, o Governo Temer ao realizar o cálculo previdenciário desconsidera em suas contas várias receitas que deveriam fazer parte do Orçamento da Seguridade Social – que abarca Previdência, Saúde e Assistência Social. Tais receitas são as contribuições sociais, como a Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), Concursos de Prognósticos e Contribuição Social sobre Obras, entre várias outras. Para se ter uma ideia, só a Cofins e a CSLL somaram mais de R$ 260 bilhões em 2015, segundo o Tesouro Nacional.

Vários especialistas que se debruçaram sobre o tema – como a economista Denise Gentil, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – narram que, se levadas em conta essas receitas, a Seguridade Social é superavitária há anos. Contudo, o Governo apresenta conta da Seguridade Social junto com o Orçamento Fiscal, contrariando a Constituição, que determina a apresentação desses dois orçamentos separadamente.

E ainda se tem um argumento irrefutável para depor contra a alegação do Governo, que é a composição de cálculo com a Desvinculação das Receitas da União (DRU), utilizada desde meados de 1994, com a qual é retirada grande parte destes recursos para financiar outras despesas não ligadas à Seguridade Social. Atualmente, a DRU está no percentual de 30% – sendo que esta fora uma das primeiras coisas que o Governo Temer fez, majorar a DRU em 50%, subindo seu percentual de 20% para 30%. Desta forma, é possível perguntar como fora possível a DRU pegar dinheiro da Seguridade Social se esta estava quebrada? A resposta possível, por óbvio, é que o sistema não está quebrado!

E, finalmente, se o Governo não tivesse feito tantas desonerações fiscais para prefeituras, empresas etc. – que apenas em 2015 transpassaram R$ 104 bilhões, sem contar as feitas atualmente, como incentivo para passar as reformas previdenciária e trabalhista – não estaríamos aqui com este “abacaxi” nas mãos. Sem contar os maiores devedores previdenciários, o que chega à casa dos trilhões.

Desta forma, por qualquer lado que se olhe a Previdência Social brasileira, se observa que a mesma não está quebrada, na verdade ela é superavitária e, desta forma, não teríamos motivos para a aludida reforma. Sem contar que não deve o custo ser entendido como gasto com a Previdência Social, e sim investimento no social, no povo e no País!

Os governantes deveriam trabalhar para o povo e somente realizar o que este assim deseja. Como se sabe, um problema guarda sempre mais de uma solução. Assim, pergunto: A reforma é mesmo necessária? Qual é a Previdência Social que queremos? Qual Previdência deixaremos para nossos filhos?