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Na última sexta-feira, 21 de maio, a Associação Paulista de Medicina (APM) realizou mais uma edição virtual do Cine Debate 2021, discutindo o poder do inconsciente presente no longa-metragem turco “Filhos de Istambul”, de 2021, dirigido por Can Ulkay. O filme é focado em Mehmet, catador de papel nas ruas de Istambul, e o pequeno órfão Ali. Ambos levam uma vida de miséria, enquanto Mehmet confronta seu passado traumático e busca a mãe de Ali.

Um dos palestrantes convidados foi Jeffis Carvalho, jornalista e roteirista, que já participou de outras edições do Cine Debate. Ele definiu “Filhos de Istambul” como um dos filmes mais tristes dos últimos anos. “Ele começa nos vendendo uma possibilidade que não acontece. Como espectador de cinema, sempre esperamos um final que nos dê um pouco de alento, quando não até mesmo um efeito catártico. E esse filme se nega a nos entregar isso. Ele é triste na abordagem e na conclusão.”

Destacando os pontos positivos do longa, Carvalho ressalta que o filme trata de uma discussão muito difícil, que é o abandono de crianças. “Além da miséria na Turquia. Uma situação de similaridade com o Brasil. A identificação é muito rápida”, afirmou. O especialista também argumenta que “Filhos de Istambul” une o realismo ao naturalismo. “Você percebe no desempenho e no texto que é um retrato realista daquela situação.” Por outro lado, explicou, as imagens são apresentadas com uma estética quase publicitária.

Visão médica
Na sequência, foi a vez do debatedor Alfredo Augusto Toscano contribuir. Ele, que é médico psiquiatra e psicoterapeuta de adultos e adolescentes, começou a sua intervenção concordando com Jeffis Carvalho quanto à tristeza de “Filhos de Istambul”. “Fiquei emocionado em algumas cenas.”

Antes de ingressar por sua especialidade, ele lembrou que os filmes turcos têm pouca entrada no Brasil, diferentemente das novelas, que conhecemos mais, mas que carregam sempre dramaticidade. “Nesse filme, inevitável fazermos paralelo com São Paulo e seus bairros. Fui transportado para a Bela Vista ou para o Bixiga.”

Em relação aos componentes psicológicos do longa, Toscano os definiu como “riquíssimos”. Segundo sua análise, o tema central do filme é o abandono e a tentativa de reparação a partir desse episódio, com todas as suas consequências.

“Entre os pontos de vista que percebemos, podemos falar da perspectiva da morte. Mehmet está esperando um rim e a doença pode ter desencadeado àquilo [que ocorre durante o filme]. Do ponto de vista psiquiátrico, é possível observarmos delírios e alucinações do personagem, com organicidade ou, quem sabe, por psicose induzida por medicamento”, analisou o psiquiatra.

Por fim, ele destacou uma das frases mais emblemáticas do filme: “Morrer não é o problema. E os sonhos que temos?”. “Os sonhos têm caráter prospectivo, de alimentar a vida e nos jogar para a frente. E, assim, carrega possibilidade de conserto e reparação. Na condição de Mehmet, se ele morre, os sonhos acabam. Muito emblemático” completou Toscano.

Wimer Bottura Júnior, coordenador do Cine Debate, também participou da conversa, lembrando a relação de Mehmet com a mãe, a quem ele enxerga e busca em todas as mulheres do filme. “Do ponto de vista psiquiátrico, vemos que ele tomava muitos remédios. Lembro que a insuficiência renal, com a qual convive, amenta o nível de ureia circulante, o que pode acarretar delírios e alucinações, quase como em uma demência, eventualmente. É comum idosos com sintomas psiquiátricos causados por uma desregulação bioquímica por acúmulo de ureia”, complementou o médico psiquiatra.

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