O QUE DIZ A MIDIA
08/02/2021 - Entenda como é produzido principal insumo de vacinas
Depois do atraso, da apreensão e dos imbróglios diplomáticos, a matéria prima que vai permitir que o Brasil expanda sua campanha de vacinação contra o coronavírus finalmente começou a chegar ao país.
É o tão falado IFA (Insumo Farmacêutico Ativo), que desembarcou na quarta (3) no Instituto Butantan, em São Paulo, e no sábado (6) à Fiocruz, no Rio de Janeiro.
Por enquanto, os dois laboratórios só usam insumos e imunizantes que vieram prontos da China ou da Índia. No segundo semestre, ambos planejam terminar de adaptar as fábricas e começar a produzir as próprias matérias primas.
Em resumo, o IFA é o principal ingrediente da receita. “É o fermento que faz o bolo crescer. Sem ele, sobraria só farinha, açúcar e corante”, diz Norberto Prestes, presidenteexecutivo da Associação Brasileira da Indústria de Insumos Farmacêuticos (Abiquifi).
Cada vacina ou medicamento tem seu IFA, que também depende de outras substâncias para ser ingerido e fazer o corpo reagir.
No caso dos medicamentos em geral, o IFA é feito do petróleo —que é transformado por processo de química fina. Já os imunizantes têm como base elementos biológicos: o próprio vírus, por exemplo.
A Coronavac e a vacina da AstraZeneca/Oxford têm princípios ativos distintos, produzidos por empresas distintas, na China, mas passam por processos parecidos.
A primeira etapa é fazer o vírus se reproduzir. Para isso, ele é introduzido em células animais (de rim de macaco no caso da Coronavac). As células são introduzidas em meio de cultura com nutrientes, sais e PH para que se repliquem.
“Multiplicação da célula e do vírus acontece ao mesmo tempo”, diz Tiago Rocca, gerente de parcerias estratégicas do Butantan. “O vírus sempre precisará de célula hospedeira. Nas vacinas de influenza, é ovo embrionado. Na vacina de HPV ou hepatite, é fungo.”
Esse processo demanda o uso de biorreatores, grandes caldeirões que “cozinham” a substância e ainda estão sendo comprados pelos laboratórios. Depois de produzir lote de vacinas, essa espécie de grande bolsa plástica é descontaminada, incinerada e trocada por uma nova.
É na próxima etapa que os IFAs da Coronavac e da vacina de Oxford se diferenciam.
Como a primeira usa o próprio coronavírus como matéria prima, precisa torná-lo inativo para não infectar humano quando aplicado (técnica se chama vacina de vírus inativado). A inativação é feita utilizando três fatores: adição de agentes químicos, regulação da temperatura e tempo, ciclo que demora horas.
Já na vacina da AstraZeneca, é usado adenovírus de chimpanzé que não causa doença em humanos, por isso não é preciso inativá-lo. É “vetor viral” (outra técnica) inofensivo, que apenas carrega a proteína do coronavírus ao corpo.
O momento de lidar com vírus vivo é delicado e exige medidas que impeçam que ele saia do ambiente, como ar-condicionado com filtros, adaptações que Butantan está fazendo e Fiocruz já possui.
A fase seguinte é de filtrar e purificar a substância até que sobre só o vírus, removendo células, meio de cultura em que elas foram inseridas e elementos que elas produziram durante a multiplicação.
Depois, são adicionados à matéria bruta os adjuvantes, agentes químicos que “mostram” o antígeno para o sistema imune do corpo e o estimulam a produzir resposta.
“Não usamos transportador. Há vacinas que usam molécula para proteger o princípio ativo”, diz Rocco, do Butantan. “Nossa vacina tem ação sistêmica, geral no corpo. Há vacinas, como spray nasal, que estimula anticorpos primeiro no sistema respiratório.”
Agora o IFA está pronto. As últimas etapas são diluilo em “água para injetáveis” (por isso poucos litros do princípio ativo podem produzir grande quantidade de doses), envasá-lo, rotulá-lo e inspecionar a qualidade. São os únicos processos feitos no Brasil por enquanto, até que a tecnologia seja importada.
Iniciativas brasileiras para desenvolver vacinas com um IFA 100% nacional estão em curso.
Fonte: Folha de S.Paulo