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08/12/2021 - Governo vai cobrar quarentena de cinco dias de viajantes não vacinados

O governo brasileiro exigirá cinco dias de quarentena a viajantes que venham ao país e não comprovem que tomaram vacina contra a Covid, anunciaram os ministros Marcelo Queiroga (Saúde) e Ciro Nogueira (Casa Civil).

Além do comprovante de imunização, será necessário apresentar o resultado negativo de um teste para detectar coronavírus feito até 72 horas antes. Não foram dados detalhes de como será fiscalizado o isolamento.

É a primeira medida ampla da gestão Jair Bolsonaro em relação a viajantes desde que foi identificada a variante ômicron, mais transmissível. Estudos para verificar a letalidade da cepa e a reação à vacina estão em curso.

Bolsonaro, que minimiza a pandemia desde seu início, reluta em adotar restrições e exigir o passaporte vacinal no país, no que é contestado pela Anvisa. Horas antes do anúncio, ele comparou o documento a uma coleira.

O presidente reclamou de ser tratado como único chefe de Estado que agiu diferente e tentou explicar por que promoveu a hidroxicloroquina, ineficaz: “Estudei, corri atrás, liguei para embaixadores, médicos”.

“Essa coleira que querem colocar no povo brasileiro. Cadê a nossa liberdade? Prefiro morrer do que perder a minha liberdade

Tem de ter coragem para falar. Parece que sou o único chefe de Estado no mundo que teve posição diferente. Dizem que toda a unanimidade não é bem-vinda. E o que eu fiz? Estudei, corri atrás Jair Bolsonaro presidente da República

brasília O governo Jair Bolsonaro (PL) decidiu exigir uma quarentena de cinco dias de viajantes não vacinados que entrarem no Brasil. Pela nova regra, quem apresentar o certificado de imunização contra a Covid e teste negativo poderá cruzar a fronteira sem passar pelo período de isolamento.

A mudança foi anunciada nesta terça-feira (7) pelos ministros Ciro Nogueira (Casa Civil), Marcelo Queiroga (Saúde) e Bruno Bianco (Advocacia-Geral da União) e contraria o discurso negacionista de Bolsonaro.

Horas antes, durante evento de assinatura dos contratos do leilão do 5G, no Palácio do Planalto, o presidente comparou o passaporte da vacina a uma coleira.

“Essa coleira que querem colocar no povo brasileiro. Cadê a nossa liberdade? Prefiro morrer do que perder a minha liberdade”, disse Bolsonaro.

Mais tarde, Queiroga praticamente repetiu a frase do presidente. “Essa questão da vacinação tem dado certo porque respeitamos as liberdades individuais. O presidente falou há pouco: às vezes é melhor perder a vida do que perder a liberdade”, disse o ministro no anúncio das mudanças de regras sobre fronteiras.

Os viajantes não vacinados devem realizar um teste para a Covid-19 no quinto dia de isolamento. Se o resultado for negativo, podem circular no Brasil.

Ainda não há detalhes sobre como será organizada e fiscalizada a quarentena dos não vacinados. Os representantes dos ministérios devem voltar a se reunir nesta quarta-feira (8) para finalizar uma portaria com as novas regras. A ideia é publicar o texto depois da conversa, à tarde.

O governo também decidiu reabrir as fronteiras terrestres a quem estiver vacinado. Não ficou claro se as regras serão iguais para quem entra por terra ou voos. A Anvisa sugere que a fronteira por terra seja apenas liberada a quem está imunizado, sem a possibilidade de quarentena. Os ministros não quiseram responder as perguntas da imprensa.

Como revelou a Folha ,aAnvisa sugeriu, em 12 de novembro, a cobrança da vacinação ou a imposição de quarentena de quem entra no Brasil. A pressão pelo controle mais rígido das fronteiras aumentou com a descoberta da variante ômicron.

Na prática, o governo aceitou o cerne da proposta da Anvisa, apesar da retórica negacionista de Bolsonaro.

Para contornar o discurso de Bolsonaro, os ministros evitaram o termo “passaporte da vacina” e destacaram que pessoas não imunizadas têm a opção de fazer quarentena no Brasil.

“Nesse contexto que estamos espreitados pela variante ômicron, que não sabemos ainda o total potencial, [vamos] requerer que indivíduos não vacinados cumpram quarentena de cinco dias. E após essa quarentena realizariam teste, sendo negativo, poderiam normalmente, no caso de estrangeiros, aproveitar todas as belezas desse nosso grande Brasil”, disse Queiroga.

Bolsonaro estava travando a decisão de cobrar o certificado de vacinação. Para não desagradar o presidente e apoiadores do governo, auxiliares do mandatário avaliavam esperar uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre o controle das fronteiras.

Mas a pressão sobre o governo cresceu e ministros passaram a considerar inevitável endurecer o controle das fronteiras. Além da Anvisa, TCU (Tribunal de Contas da União), DPU (Defensoria Pública da União) e Fiocruz pediram a cobrança do certificado de imunização de viajantes.

Na segunda-feira (6), o ministro Luís Barroso, do STF, deu 48 horas para o Planalto se manifestar sobre o pedido da Anvisa. Com todas as cobranças somadas, técnicos do governo passaram a temer ações administrativas ou na Justiça por omissão.

Portarias sobre controle de fronteiras são assinadas pelos ministros da Casa Civil, Saúde, Infraestrutura e Justiça. A agência apenas faz sugestões, mas não tem poder decisório.

No anúncio à imprensa, Queiroga fez menção indireta e crítica ao chamado passaporte da vacina. “Esse enfrentamento da pandemia não diz respeito apenas a um chamado passaporte, que mais discórdia do que consenso cria. É necessário defender as liberdades, respeitar os direitos dos brasileiros acessarem livremente as políticas públicas de saúde”, disse.

Para convencer o presidente, os ministros alinharam um discurso para amaciar a nova regra e passar a impressão de que foi rejeitado o passaporte da vacina, ainda que o governo vá cobrar regras mais rígidas de quem não tomou o imunizante contra a Covid.

A Anvisa não participou da reunião, segundo integrantes do governo. Além de reduzir infecções, casos graves e transmissão, a ideia da agência é impedir que o Brasil vire foco do turismo antivacina.

Em evento durante a manhã, o presidente distorceu e criticou as recomendações da Anvisa e disse que a agência “quer fechar o espaço aéreo”. “De novo, porra? De novo vai começar esse negócio?”, questionou o presidente, exaltado, diante de uma plateia de empresários em cerimônia da CNI (Confederação Nacional da Indústria).

“Ah, o ômicron. Vai ter um montão de vírus pela frente, um montão de variante pela frente, talvez. Peço a Deus que esteja errado, mas temos que enfrentar”, completou.

O presidente disse ainda que adotou uma postura diferente em relação a outros líderes mundiais no enfrentamento da pandemia da Covid-19.

“Tem de ter coragem para falar. Parece que sou o único chefe de Estado no mundo que teve posição diferente. Dizem que toda a unanimidade não é bem-vinda. E o que eu fiz? Estudei, corri atrás, liguei para embaixadores fora do Brasil, médicos. Pessoal da Amazônia. O que tem de fazer, qual a alternativa? Falei de um possível medicamento”, disse, ao fazer menção indireta à hidroxicloroquina.

Bolsonaro também voltou a dizer que quem toma a vacina pode contrair, transmitir e “morrer também” por causa do coronavírus. A imunização reduz as chances de que a pessoa desenvolva casos graves da doença. Bolsonaro diz que não se vacinou até hoje.

Mais tarde, no evento do leilão do 5G, o presidente também apostou na defesa de tratamentos sem eficácia. Além de citar a cloroquina e a ivermectina, disse que “ninguém tinha morrido” em duas aldeias indígenas que visitou, pois os moradores tomavam plantas e ervas medicinais.

“Vemos briga sobre passaporte vacinal. Quem é favorável, não se esqueça: amanhã alguém pode impor algo que você não seja favorável”, disse. Ele voltou a levantar dúvidas sobre a segurança na vacinação das crianças.

O STF recebeu, no dia 26 de novembro, uma ação do partido Rede Sustentabilidade com pedido para adotar o chamado passaporte da vacina.

“A inércia trata-se, em verdade, de mais uma postura adotada pelo negacionismo e pela postura antivacina do governo do presidente Jair Messias Bolsonaro”, afirmou o partido no pedido.

Representantes da Saúde tentavam convencer interlocutores de Bolsonaro de que é vantajoso pedir o comprovante. Um dos argumentos apresentados é que as restrições de entrada por terra ficariam menos duras ao liberar quem está imunizado.

Hoje essas fronteiras estão praticamente fechadas, ou seja, um cenário ainda mais restritivo do que o proposto pela Anvisa. Essa ala do governo também afirmava que o Brasil poderia sofrer restrições de outros países caso mantivesse as fronteiras e aeroportos desprotegidos.

Fonte: Folha de S.Paulo